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"O coração que se ganha é o que se dá em troca"Marcelino Freire



quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

II Feira do Livro de Fortaleza - Walcyr Carrasco (I)

Foto: Divulgação do evento

Recentemente, postei aqui alguns comentários sobre a passada do escritor e contador de histórias Ilan Brenman aqui em Fortaleza, em ocasião da II Feira do Livro Infantil (veja aqui). Agora, falarei um pouco sobre talvez o maior destaque desta edição do evento, a presença do escritor e autor Walcyr Carrasco. Nesse post, dividido em duas partes, procurei colocar uma visão geral de como foi a apresentação, sob meu ponto de vista.

Walcyr sem dúvida foi uma alavanca de formidável impulso para levar à Praça do Ferreira um excelente público, para um evento literário em ascensão; cerca de 150 pessoas somente em sua apresentação. Eu mesmo, inclusive, fui motivado a ir conhecê-lo. Admiro muito o seu trabalho, não somente na área de teledramaturgia, onde talvez seja mais conhecimento e amplamente divulgado, mas também na literária; Walcyr Carrasco tem uma sólida carreira como escritor, com diversos livros publicados, destacando-se os infantis, mas também com infanto-juvenis e romances, além de traduções, adaptações e peças de teatro.

Um de meus livros favoritos e, devo dizer, fundamentais para minha escolha por trilhar também o caminho das letras é da autoria de Walcyr. Trata-se de O Caçador de Palavras, um livrinho pequeno e pouco conhecido, que atualmente já não é editado. Mesmo assim, muitos devem lembrar dele por ter vindo junto com o dicionário LUFT, da editora Ática, em meados de 1993. É uma história curta, breve, mas que transmite um ideal tão vasto que até hoje me influencia. Enfim, falarei mais sobre este livrinho em uma postagem exclusiva, ainda por vir.

Voltando ao assunto central, Walcyr Carrasco fecharia a II Feira do Livro Infantil com chave de ouro. Sua participação estava marcada para o sábado, 17 de setembro. Na ocasião, Walcyr daria uma palestra sobre sua obra e carreira e ainda concederia uma sessão de autógrafos. Seria bem parecido como foi com Ilan Brenman, com a diferença massiva estando por conta da quantidade de público presente.

Marcada para as 15:00, me programei para evitar atrasos, saindo com certa antecedência, sem esquecer, é claro, de levar O Caçador de Palavras comigo; faria questão que Walcyr o autografasse. Sabia que a movimentação lá seria intensa e queria também um bom lugar para sentar, assim, cheguei à Praça do Ferreira por volta das 14:45. Quase não acreditei quando olhei para a tenda central: estava praticamente lotada. Dezenas e dezenas de crianças, fardadas, provavelmente de escolas, enchiam as muitas cadeiras que tinham sido dispostas, em meio ao mini palco onde ficavam os palestrantes. Além delas, havia também um enorme público geral, compondo os locais restantes e também curiosos nas imediações da tenda. Àquela hora, já era impossível pegar um lugar à frente; tive de me conformar em sentar bem atrás. Uma vez acomodado, comecei a olhar novamente em volta, observando o tipo de público que ali estava. Fazia um calor imensurável nesse momento, mesmo a tenda sendo ao ar livre (ou talvez justamente por isso).

Foto: Denis Akel

Pouco antes da hora marcada, o responsável pela locução do evento subiu ao mini palco e avisou, com voz entusiasmada, que Walcyr logo entraria. Somente essa declaração já foi suficiente para levar todos ao delírio, em sonoros gritos de euforia. E então, pontualmente às 15:00, avistei Walcyr Carrasco chegando à tenda. Trazia à cabeça uma espécie de chapéu-panamá (que depois revelaria ter ganhado já na cidade). Sua roupa, de algum modo leve e simples, transmitia segurança e tranquilidade. À aparição do autor, o público explodiu em fervorosos aplausos, juntamente com gritos e exaltação. Foi bom ver toda aquela comoção em torno de um escritor, embora soubesse que talvez a maior parte daquele estardalhaço se devesse não à sua obra literária, mas às suas novelas. Eu esperava até o final da palestra poder mudar de opinião.

Um outro detalhe que não pude deixar de notar, enquanto corria os olhos em volta, observando as pessoas, foi a forte presença de seguranças. E não pareciam seguranças comuns. Cogitei até a possibilidade de ser uma equipe especial do próprio Walcyr, já acostumada a protegê-lo. Farda escura, boina vermelha, rosto impassível. Num detalhe na manga do braço, os dizeres "defesa pessoal" podiam ser lidos. Pareciam saídos de um desses filmes de assaltos milionários.

Após receber o microfone e tomar a frente do público, Walcyr, sorridente, saudou a todos, dizendo o quão feliz estava por estar ali. Inicialmente, ele quis ler um poema de que muito gostava, de autoria de Mario Quintana. Walcyr bem que tentou, mas a plateia não facilitou; vozerios e balburdia iam se manifestando, complicando o andamento da apresentação. Além disso, graças ao microfone, que parecia estar com algum problema (não demorou a ser substituído), sua leitura começou quase inaudível. Percebendo a dificuldade repentina do público, Walcyr alertou, sério, que se todos não fizessem silêncio, ele iria embora. Pronto, bastou isso. Como num passe de mágica, as professoras das crianças, que eram as principais responsáveis pelo caos sonoro, se fizeram ouvir e buscaram conter os pequenos. Walcyr prosseguiu lendo Quintana, mas continuei ouvindo apenas palavras perdidas. Longe do palco, só ouvia uma palavra ou outra dele, espaçada – agora pelos murmúrios – do mar de crianças que estavam à minha frente.

Foto: Denis Akel

Em seguida, falou um pouco de sua carreira, de suas referências. Contou que seu gosto pela leitura veio da infância (em uma época em que sequer havia TV), através das clássicas obras de Monteiro Lobato, e que sua aptidão à escrita veio naturalmente por conta disso, por volta dos 12 anos de idade, quando começou a se descobrir escritor. Walcyr se encantou pelo Saci, Pedrinho, Emília, a ponto de decidir também querer escrever suas histórias. Daí em diante, para realizar seu intento, passou a ler muito, como deve ser o hábito de todo escritor. Apontou os contos de fadas como um de seus gêneros favoritos, citando a obra de Hans Christian Andersen, célebre por O Patinho Feio, A Pequena Sereia, entre outros. Falou ainda de nomes como Shakespeare, que ele muito admira e até traduz, a Júlio Verne, e de como gosta de fazer referências sutis a eles em suas obras. Ressaltou ainda o quão visionário Verne foi, ao escrever 20.000 Léguas Submarinas em uma época onde não existiam submarinos. Ainda sobre o ato e gosto pela leitura, enfatizou que o conceito de gostar ou não gostar de algo é muito relativo, pois pode-se muito bem aprender a gostar ou aprender a não gostar, seja lá do que se tratar.

Foto: Denis Akel


Seguindo-se a esta breve introdução, duas pessoas, cujos nomes ou cargos não me recordo, mas que certamente haveriam de ser pessoas de peso no evento (talvez até alguém de importância na cidade), foram chamadas ao centro da tenda, onde leriam alguns trechos de livros do Walcyr. Durante a leitura de seus textos, Walcyr Carrasco manteve-se sentado, ao lado da pessoa que lia. Percebi que ele vagueava o olhar pela plateia, como se buscasse conhecer melhor seu público, mas sem se distrair do que era lido. Porém, notei que a fatia do público que prestava atenção era muito pequena. Eu mesmo não conseguia acompanhar direito alguns trechos. Achei que os textos escolhidos foram demasiados longos, o que pareceu enfadar rapidamente boa parte do público, que, disperso, fazia barulho e atrapalhava quem queria ouvir e estava mais longe do palco, como eu.

Não lembro exatamente se foi nesse momento, ou mais no início, mas Walcyr ainda ganhou um livro de presente de uma pessoa do público, que fez questão de deixar claro que o livro só seria colocado à venda ano que vem, e que aquele exemplar era exclusivamente para ele. Walcyr, surpreso e admirado, mostrou o livro ao público, repetindo o que ela disse.

Findadas as leituras, o público respondeu com aplausos. Walcyr Carrasco continuou, então, tornando a falar, agora mais detalhadamente, de sua carreira, projetos e trabalhos. Ele esbanjava simpatia, usando seu chapéu-panamá que – como revelou depois – ganhara na ocasião, mas que lhe caiu perfeitamente; parecia quase feito para ele.  Walcyr falou que inicialmente escrevia para jornais e revistas (Revista Recreio) e que aos poucos foram lhe aparecendo oportunidades de escrever para teatro e TV. Disse ainda que chegou à Globo com muito trabalho e dedicação, e que isso já fazia dez anos. Mesmo com uma vasta liberdade de produção na TV, adora escrever livros para o público infantil, pois vê nessas histórias muito mais do que elas aparentam representar.

Foto: Denis Akel


Passada a introdução de Walcyr, a leitura de seus textos e do poema de Quintana, teve-se início o bloco de perguntas. Um microfone foi sendo conduzido a uma das muitas mãos que sempre se arguiam; todos buscavam  poder dirigir algumas palavras ao escritor. Uma das primeiras perguntas a surgir foi quanto à sua rotina de trabalho, em que hora ele costumava escrever. A isso Walcyr Carrasco respondeu de imediato, com ar brincalhão, arrancando sonoros risos de todos: "Sou um vampiro!". Com isso, quis dizer, como explicou em seguida, que tinha hábitos notívagos. Disse que usualmente começava a escrever às 23:00, indo até as 3 ou 4 da manhã (quem o conhece do Twitter sabe que é mais ou menos nesse horário que ele vai fumar seu charuto e meditar!).

Como não poderia deixar de ser, Walcyr foi fustigado com várias perguntas referentes à sua novela Morde & Assopra, ainda em exibição na época. Foram realmente muitas perguntas, desde as mais inocentes, como crianças que realmente acreditavam que havia um rôbo vivendo o personagem da Naomi Rôbo, a outras mais extravagantes, como: "Como você fez a cena onde o rôbo remove parte de sua pele artificial e exibe seus componentes eletrônicos?" Walcyr, direto, respondeu à primeira dizendo que era a atriz que fazia as duas personagens, que era mérito dela a "versão rôbo"ficar tão autêntica. Quanto à segunda pergunta, disse categoricamente que não foi ele quem fez a cena mencionada, e completou sua resposta, dando a todos um breve panorama de como funciona o andamento de uma novela, da concepção da cena à sua filmagem. Walcyr disse que ele somente escrevia. Em seguida, o produtor irá negociar detalhes que envolvem a cena (locações, etc) e o diretor a dirige. Citou ainda um exemplo, usando uma praia daqui de Fortaleza como ambiente. Ele escreveria o que iria ocorrer, o produtor entrava em contato com a prefeitura da cidade, para negociar detalhes da locação, e o diretor executava a direção. Em termos, foi bem claro ao dizer que poderia escrever praticamente o que quisesse e o produtor teria que se virar para conseguir realizá-la, o que arrancou mais boas risadas do público. Ainda sobre o tema de produção, alguém perguntou quem escolhe o elenco de suas novelas, e se a opinião dele é unânime. Walcyr respondeu, sucinto, que é 50% ele, 50% a emissora/equipe.

Tivemos também algumas perguntas bem incomuns, que geraram respostas bem contundentes. Em dado momento, Walcyr foi indagado sobre quais alguns de seus momentos felizes e tristes. Respondeu dizendo que tenta não ter momentos tristes; tenta sempre enxergar o lado bom que há em tudo. Completou dizendo que embora muitas vezes não consigamos fazer essa distinção, é um bom caminho para sofrermos bem menos.

Outra pergunta, ainda sobre Morde, foi referente ao desfecho de alguns personagens. Walcyr riu-se, e de certa forma insinuou, mas acabou não revelando nada, deixando suspense e ansiedade no público que assistia à novela. E sem deixar o assunto novelas de lado, um menino quis saber se o macaco pintor de Caras & Bocas, trama que repercutiu bastante em 2009, realmente pintava. Walcyr contou uma história sobre um macaco nos EUA, que nos anos 30, 40, ficou muito famosos por pintar, tendo inclusive vendido muitas telas. O macaco de sua novela (na verdade uma macaca) gostava muito de desenhar, mas não pintava.

Encerradas as perguntas, o público prorrompeu em um forte e prolongado aplauso. Walcyr Carrasco sorria, no centro de todos. Mas aquele momento ainda não terminaria: teríamos ainda a sessão de autógrafos. O narrador do evento assumiu o microfone  e começou a organizá-la. E é a partir de lá que começa a segunda parte dessa postagem, em breve no ar!

E para finalizar, alguns trechos que consegui captar da palestra. A qualidade não é das melhores, mas todo registro é válido. :)

Veja a segunda parte aqui.