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"O coração que se ganha é o que se dá em troca"Marcelino Freire



terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Nos caminhos da música – memórias de um teclado quase esquecido



Bom, aproveitando que este é invariavelmente o primeiro post do ano, falarei um pouco sobre um tema de que gosto muito, mas que ainda tinha tido pouco ou quase nenhum espaço por aqui: a música.

Agora por esses dias, coisa de dois ou três meses, comecei a me aventurar por esta fantástica arte, de uma maneira um pouco inusitada, aproveitando um antigo instrumento de quase quinze anos, que estava parado há tempos – o teclado da foto acima.

Meu interesse inicial pela música veio quando ainda era pequeno, por volta de 1991 ou 1992. Costumava tocar um pouco de flauta, nada muito significativo, mas para mim tinha um sabor único, ao soprar e ouvir e ouvir aqueles sons se entrelaçando. Não era preciso entender nada, apenas sentir. Era meio que um momento de lazer, uma distração, mas um momento onde sobretudo me sentia bem, em harmonia.

O tempo passou. A magia da infância começava a desaparecer. Vinham outros interesses, e a velha flauta foi encostada (mas ainda a tenho). Os anos foram se seguindo. Ainda tentei retomar o gosto pela música, comprando um teclado básico, ideal para iniciantes, em meados de 1997. Por alguma razão, porém, não consegui manter o interesse. Cheguei a dedilhar algumas coisas, seguindo guias simples com números e cores (que usava na flauta ), mas realmente não me apronfundei. Após mais um certo tempo, acabei guardando o aparelho, que acabaria recluso por anos dentro de armários. Meu irmão bem que ainda tentou usá-lo algumas vezes, mas também de modo passageiro. É provável que durante todo esse tempo até tenha me passado pela cabeça doá-lo ou vendê-lo, por não saber direito o que fazer com ele.

Mas este teclado ainda viveria para ter seus dias de glória. Como sempre digo por aqui, tudo tem o seu devido tempo para acontecer. Foi assim que subitamente me vi tragado de volta ao mundo da música, de uma maneira tão abrupta que de certa forma me surpreendeu, e percebi que realmente podemos fazer qualquer coisa, se realmente quisermos. Eu estava seguindo dias de certa forma iguais, monótonos até, pode-se dizer, simplesmente com as atividades rotineiras, como acho que muitas vezes fazemos, sem nos darmos conta, ou por realmente não termos escolha. Recentemente, encontrei o velho teclado em uma faxina corriqueira, e o deixei por perto (ainda o guardo na caixa original), para uma hora abrir e ver se estava tudo bem. Sabia que talvez não fizesse isso tão cedo, mas a caixa permaneceu lá, inerte, ao alcance de minha mãos. Em um certo dia, decidi agir. Não sei o que me deu, mas resolvi não só pegar o teclado, como também me dedicar a aprender a tocá-lo. E não queria apenas seguir numerozinhos e coisas parecidas; queria aprender as notas, queria entender a teoria musical.

Pensei logo em usar a internet para esse fim, valendo-me de cursos (em PDF) e vídeo-aulas, pelo menos inicialmente. Resoluto, coloquei o teclado sobre minha mesa e me preparei para ligá-lo. Sabia que precisaria da fonte, que naquele momento não fazia a menor idéia de onde estava, se é que ainda a tinha, mas lembrava de que ele também funcionava a pilhas. Virei o aparelho, abri o compartimento e relembrei o número de pilhas de que precisaria: cinco. Corri pela casa, coletando-as de outros eletrônicos, até ter as cinco em mãos. Enfim colocadas no teclado, liguei-o. Não tinha muitas esperanças de que ainda fosse funcionar – estava guardado há anos, sem uso – mas ele ligou! O vislumbre da luzinha vermelha acendendo me trouxe um sorriso de satisfação. Dedilhei um pouco algumas teclas. Parecia mesmo tudo bem com o instrumento. O som das notas me remotava ao passado, à época que o comprei, até mesmo à época da flauta. Embalado por estas boas lembranças, repeti para mim mesmo que agora chegara o momento de aprender a tocá-lo.

Incontinente, recorri a talvez um dos melhores professores que podemos ter hoje em dia: o Google. Pesquisei com determinação, até baixar um bom material, para ser lido e estudado no computador mesmo. Era o básico do básico; noções introdutórias e afins. Seria um bom primeiro passo, imaginei, e me pus a lê-los. Um dos cursos que baixei era na verdade um curso preparatório voltado a tecladistas de igreja, contando com um vasto hinário a ser aprendido pelo mesmo. Contudo, lá pude ver que estava toda a teoria, bem explicada, bem do início, e acreditei ser um bom começo. Ainda, para entender efetivamente este curso, era preciso passar por uma parte inicial de regência, onde era explicado os primeiros elementos básicos da partitura, juntamente com as noções do gestuário. Por achar tudo aquilo interessante e novo para mim, debrucei-me sobre todo este conteúdo, antes de chegar propriamente à parte do teclado.

Passei os dias seguintes bastante mergulhado nessa área, foi mesmo uma grande descoberta. À medida que lia os conceitos e os praticava no teclado, ia me surpreendendo. Partituras musicais sempre me intrigaram, por parecerem complicadas, ilegíveis, como imagino que é tudo o que desconhecemos. Quando, porém, começamos a entender a lógica daquilo, seja o que for, percebemos que não é nada assim tão inacessível. Com a música, acredito não ser diferente. Aprendendo o porquê dos símbolos, seus significados, as notas e nomenclatura, comecei a ficar ainda mais curioso diante das partituras, por agora enfim poder lê-las, pelo menos ainda as mais simplificadas. Imprimi até alguns modelos de pentagramas para treinar alguns exercícios e os nomes e posições da notas.

Meu modesto teclado, como devem ter notado, traz várias etiquetinhas coladas nas teclas. Trata-se daquele material didático que acompanhava revistas que se propunham a ensinar as primeiras noções. Lembro que as afixei com empolgação nos primeiros dias que comprei o instrumento, mas elas nunca foram exatamente muito úteis, exceto por ajudarem a memorizar algumas musiquinhas, embora eu me baseasse pelo número e não pelo nome da nota. Hoje em dia, já percebo que essas etiquetinhas mais atrapalham do que ajudam, pelo menos para mim, e logo devo mesmo removê-las. Ainda, algumas pessoas já comentaram que eu talvez devesse comprar outro teclado, maior, mais moderno. Preferi dar de ombros; meu velho teclado ainda tem muito chão pela frente. Ele é ótimo para as noções básicas que venho estudando, e percebo que, finalmente, após quase quinze anos, o teclado disse a que veio!

Falando agora sobre gêneros musicais e referências, recentemente comecei a me interessar mais por música minimalista. Já conhecia o estilo, graças a filmes como o excepcional Koyaanisqatsi, cuja trilha sonora é assinada por Philip Glass, um dos maiores nomes do minimalismo. Foi também através de outro filme, O Fabuloso Destino de Amélie Poulain, que conheci Yann Tiersen, outro grande compositor minimalista e comecei a me enveredar cada vez mais no assunto. Tecnicamente, a música minimalista tem como características a repetição de pequenos trechos, com leves variações em grandes períodos de tempo, compondo assim ritmos quase hipnóticos. Depois que comecei a me aprofundar na área musical, posso dizer que não escuto mais uma música como antes, é como se conseguisse perceber certas nuances antes imperceptíveis. Ultimamente tem sido comum, ainda, gastar horas no YouTube , procurando vídeo-aulas, exercícios ou mesmo apenas se deliciando com interpretações de músicas no piano, teclado, em especial de Glass, Tiersen, Reich, clássicos como Beethoven, Chopin e trilhas sonoras.

Todo este estudo e pesquisa autodidata que venho conduzindo (apesar de também já considerar fazer um curso com professor físico) me faz pensar mais uma vez que podemos mesmo fazer qualquer coisa que quisermos, desde que haja determinação para tal. Às vezes um pequeno passo fora de nossa rotina nos desvela um mundo desconhecido, fascinante – que estava ali o tempo todo – embora, de certa forma cegos, não pudéssemos enxergá-lo, mas que muitas vezes pode mudar toda a nossa vida. É sempre bom sair da rotina, fazer coisa diferentes, às quais não estamos acostumados ou simplesmente não sabemos ainda. Faz bem para a alma, nos reiventarmos. Posso afirmar isso por conta de meu récem-revigorado gosto pela música e também pelo súbito gosto por cozinhar, do qual já falei nesse outro post.

Ah, estou pensando em comprar um violão em breve. Só espero não demorar quinze anos para começar a tocá-lo!