Fotos: Denis Akel
A Cabana é um daqueles livros que mesmo sem termos lido, certamente já ouvimos falar, seja através de algo, alguém, ou ainda pela superexposição que a mídia faz em cima de obras como essa, os best-sellers. Dificilmente essa seria uma de minhas prioridades de leitura, mas surgiu a oportunidade de lê-lo, quando uma tia me emprestou, e como estava curioso para ver o que havia na tal cabana, abracei a chance. Devo ter passado bem mais tempo do que imaginava envolvido neste livro, pois, diferente de outros, resolvi fazer aqui um estudo mais abrangente (também para tentar entender o fenômeno que ele se tornou), analisando capítulos individualmente, repensando e refletindo os rumos da história, e foi uma experiência no mínimo curiosa, que procurarei relatar ao longo desta breve postagem.
A trama geral do livro fala de um provável encontro com Deus, no qual o protagonista, Mack, se vê diante de uma trindade divina bastante, vamos dizer, incomum. O enredo começa quando Mack passa por uma grande perda em sua família e se vê desde então imerso numa grande tristeza, desiludido do mundo e de Deus, por não entender como Ele pôde permitir tal perda. Então, certo dia, depara-se com um bilhete, aparentemente escrito por Deus, que lhe propõe um encontro na cabana que dá título à obra, justo onde se deu sua grande perda, onde a filha de Mack foi assassinada. Esse jogo de emoções marca os momentos iniciais do livro. Revisitar a cabana, palco de angústias e tristezas parece algo improvável de Mack fazer, porém a estranheza daquela mensagem provoca a curiosidade dele. Será possível que Deus realmente estará à sua espera? Essa ideia fantástica logo povoa não apenas a mente de Mack, como do leitor, que se vê igualmente tentado. E aqui se inicia toda a saga de Mackenzie Allen Philipps, uma jornada que, segundo os inúmeros comentários ilustres que precedem o primeiro capítulo, pode mudar a vida daqueles que se permitirem tocar por ela.
Comecei a ler o livro sem muita pretensão, me deixando levar por sua história, amplamente surreal, emotiva e visivelmente convidativa. Apesar de ser um livro de tamanho médio (pouco mais de duzentas páginas), há pouquíssimos personagens, podendo-se reduzi-los a apenas Mack e o trio divino. Esse detalhe deixa a história com um ar mais pessoal, mais tangível, de maneira que podemos acompanhar toda a evolução do personagem, suas transformações, e, invariavelmente, nós colocarmos em seu lugar. Em contra-partida, às vezes a narrativa se perde um pouco do foco, o que resulta em trechos repetitivos, confusos e cansativos.
A divina Trindade; Deus, Jesus e o Espírito Santo, aparecem com representações humanas bastante extravagantes, demonstrando que não há muita preocupação do autor em seguir preceitos tradicionais e teológicos, apesar de ser uma história de alto teor religioso. Os capítulos são breves, contendo praticamente apenas diálogos entre Mack e as divindades. Ele busca entender as razões pelas quais Deus faz o que faz, e questões sobre sofrimento, liberdade, fé e autoridade são diretamente focados. A cada capítulo Mack meio que recebe um novo ensinamento, como se a venda que lhe cobre a visão fosse retirada pouco a pouco.
O curioso quanto a esse livro é que, pelo que li e vi de entrevistas com William P. Young, ele foi inicialmente escrito para seus filhos, sem qualquer pretensão maior. Foi graças a dois amigos do autor que a obra foi projetada para uma tiragem maior, e foi aos poucos atingindo cada vez mais e mais pessoas, recebendo mais e mais traduções, até chegar ao status que tem hoje. Mas será que o livro é mesmo isso tudo o que dizem? Sem dúvida essa questão é bastante pessoal. Procurei lê-lo sem considerar essa ou aquela colocação, visando não ficar direcionado a pensar isso ou aquilo, mas alguns fatores que foram surgindo ao longo dos capítulos são bastante notáveis.
Primeiramente, o livro, apesar do teor religioso, desconsidera completamente a bíblia. Inclusive, pelo que pesquisei, é alvo de inúmeras polêmicas que alegam que ele deturpa boa parte do que é dito nas Escrituras. Ainda, sugere que a bíblia contém inverdades, mas que seria mesmo assim usada por Deus devido à complexidade que se tornou a vida humana depois de se afastar Dele. Assim, a trama também sugere que há verdades além da Bíblia que só o homem que se relaciona com Deus pode alcançar. Um exemplo disso está no capítulo 6 (Aula de voo), quando Deus ironiza: "Aqui não é escola dominical. É uma aula de voo".
O principal entrechoque de opiniões referentes a A Cabana, a meu ver, é justamente quando se quer pensar nela como "uma nova bíblia". O livro tem sim um alto valor emocional, uma ótima história, reconfortante até, mas em nenhum momento deve ser confundido com nada além disso. Um de meus pensamentos, durante a leitura foi "com que liberdade o autor pode se colocar no papel de Deus e dizer o que é certo ou errado? E como as pessoas que lêem acreditam assim tão cegamente?" Tudo o que ele faz é criar um estereótipo para Deus, mas o faz de maneira realista, convincente. Young vende seus princípios sobre Deus como se fosse a mais absoluta verdade, mas acaba, involuntariamente, contrariando a Palavra revelada por Ele.
Por não ter qualquer intenção de concordar com as Escrituras, o livro busca inserir novos conceitos, apresentar uma nova verdade, uma verdade que se por um lado pode ser bastante herética, por outro permite uma visão bastante peculiar e ousada, que deve ser interpretada não como verdade absoluta, mas como um ponto de vista, o ponto de vista do autor. Segundo ele, aliás, a simbologia da cabana atua como uma metáfora para um local de aprisionamento ou de dor, como se cada pessoa tivesse uma cabana em sua vida, ou seja um lugar que de alguma maneira as machucou profundamente e que jamais pensam em voltar. Imagino também que o protagonista da história, Mack, tenha muito de William P. Young, de maneira que a trama constitui um relato bastante particular, a história de sua vida, pode-se dizer, pois havia sido escrita a seus filhos.
Deixando de lado o fator teológico e focando um pouco no aspecto literário, A Cabana é excelente, no âmbito de ser uma história feita sob medida para emocionar e comover. Há um aspecto de realidade mesclado com fantasia, como uma fábula, que valoriza bastante a trama, tornando-a agradável e atrativa. A narração, viva e pungente, descreve com clareza a intensa viagem pela qual o protagonista passa, com cenas em geral bem construídas e articuladas. À primeira vista, o livro tem fortes ares de romance policial, à medida que somos apresentados aos personagens, à trama e ao lugar. Em certo capítulo, porém, dá-se uma virada brusca nesse ponteiro, e chegamos assim ao córrego que nos conduzirá até o final; conversas de Mack com a trindade. Pode até ser impressão, mas percebi que a partir daqui um ou outro capítulo não consegue manter a força do anterior, de modo que ficamos sempre à espera de que aconteça algo realmente relevante na história.
Uma das coisas que mais me desagradou no livro, e que também foi uma certa surpresa, surgiu logo quando o terminei. Nas últimas páginas há um "pedido" nada modesto, para que simplesmente o leitor busque passar aquela história adiante, oralmente ou mesmo dando o livro de presente a amigos, familiares e até desconhecidos. A pretensão com que o "livro" (na verdade um grupo de leitores muito tocados pela obra) fala de si mesmo chega a ser ridícula, de modo que ele nitidamente perde o foco ao se supervalorizar. É preciso mesmo que o público seja lembrado? Se a obra afinal é tão contundente e transformadora, nada mais natural do que ela contagiar naturalmente mais e mais pessoas, sem a necessidade de que sejam sugeridas maneiras de como fazer isso. É como dizem, quem fala demais de si é porque no fundo não tem nada a dizer. A partir do momento que é pedido para que sua história seja passada adiante fica implícito um receio de que ela, por si só, não consiga esse feito. E ainda, de certa forma, é quase como se ao fazer isso o livro, e também o grupo de leitores, contrariasse os ensinamentos do Deus inventado pelo próprio autor, que afirma em certo trecho que "Eu não crio instituições. Nunca criei, nunca criarei".
O curioso quanto a esse livro é que, pelo que li e vi de entrevistas com William P. Young, ele foi inicialmente escrito para seus filhos, sem qualquer pretensão maior. Foi graças a dois amigos do autor que a obra foi projetada para uma tiragem maior, e foi aos poucos atingindo cada vez mais e mais pessoas, recebendo mais e mais traduções, até chegar ao status que tem hoje. Mas será que o livro é mesmo isso tudo o que dizem? Sem dúvida essa questão é bastante pessoal. Procurei lê-lo sem considerar essa ou aquela colocação, visando não ficar direcionado a pensar isso ou aquilo, mas alguns fatores que foram surgindo ao longo dos capítulos são bastante notáveis.
Primeiramente, o livro, apesar do teor religioso, desconsidera completamente a bíblia. Inclusive, pelo que pesquisei, é alvo de inúmeras polêmicas que alegam que ele deturpa boa parte do que é dito nas Escrituras. Ainda, sugere que a bíblia contém inverdades, mas que seria mesmo assim usada por Deus devido à complexidade que se tornou a vida humana depois de se afastar Dele. Assim, a trama também sugere que há verdades além da Bíblia que só o homem que se relaciona com Deus pode alcançar. Um exemplo disso está no capítulo 6 (Aula de voo), quando Deus ironiza: "Aqui não é escola dominical. É uma aula de voo".
O principal entrechoque de opiniões referentes a A Cabana, a meu ver, é justamente quando se quer pensar nela como "uma nova bíblia". O livro tem sim um alto valor emocional, uma ótima história, reconfortante até, mas em nenhum momento deve ser confundido com nada além disso. Um de meus pensamentos, durante a leitura foi "com que liberdade o autor pode se colocar no papel de Deus e dizer o que é certo ou errado? E como as pessoas que lêem acreditam assim tão cegamente?" Tudo o que ele faz é criar um estereótipo para Deus, mas o faz de maneira realista, convincente. Young vende seus princípios sobre Deus como se fosse a mais absoluta verdade, mas acaba, involuntariamente, contrariando a Palavra revelada por Ele.
Por não ter qualquer intenção de concordar com as Escrituras, o livro busca inserir novos conceitos, apresentar uma nova verdade, uma verdade que se por um lado pode ser bastante herética, por outro permite uma visão bastante peculiar e ousada, que deve ser interpretada não como verdade absoluta, mas como um ponto de vista, o ponto de vista do autor. Segundo ele, aliás, a simbologia da cabana atua como uma metáfora para um local de aprisionamento ou de dor, como se cada pessoa tivesse uma cabana em sua vida, ou seja um lugar que de alguma maneira as machucou profundamente e que jamais pensam em voltar. Imagino também que o protagonista da história, Mack, tenha muito de William P. Young, de maneira que a trama constitui um relato bastante particular, a história de sua vida, pode-se dizer, pois havia sido escrita a seus filhos.
Deixando de lado o fator teológico e focando um pouco no aspecto literário, A Cabana é excelente, no âmbito de ser uma história feita sob medida para emocionar e comover. Há um aspecto de realidade mesclado com fantasia, como uma fábula, que valoriza bastante a trama, tornando-a agradável e atrativa. A narração, viva e pungente, descreve com clareza a intensa viagem pela qual o protagonista passa, com cenas em geral bem construídas e articuladas. À primeira vista, o livro tem fortes ares de romance policial, à medida que somos apresentados aos personagens, à trama e ao lugar. Em certo capítulo, porém, dá-se uma virada brusca nesse ponteiro, e chegamos assim ao córrego que nos conduzirá até o final; conversas de Mack com a trindade. Pode até ser impressão, mas percebi que a partir daqui um ou outro capítulo não consegue manter a força do anterior, de modo que ficamos sempre à espera de que aconteça algo realmente relevante na história.
Uma das coisas que mais me desagradou no livro, e que também foi uma certa surpresa, surgiu logo quando o terminei. Nas últimas páginas há um "pedido" nada modesto, para que simplesmente o leitor busque passar aquela história adiante, oralmente ou mesmo dando o livro de presente a amigos, familiares e até desconhecidos. A pretensão com que o "livro" (na verdade um grupo de leitores muito tocados pela obra) fala de si mesmo chega a ser ridícula, de modo que ele nitidamente perde o foco ao se supervalorizar. É preciso mesmo que o público seja lembrado? Se a obra afinal é tão contundente e transformadora, nada mais natural do que ela contagiar naturalmente mais e mais pessoas, sem a necessidade de que sejam sugeridas maneiras de como fazer isso. É como dizem, quem fala demais de si é porque no fundo não tem nada a dizer. A partir do momento que é pedido para que sua história seja passada adiante fica implícito um receio de que ela, por si só, não consiga esse feito. E ainda, de certa forma, é quase como se ao fazer isso o livro, e também o grupo de leitores, contrariasse os ensinamentos do Deus inventado pelo próprio autor, que afirma em certo trecho que "Eu não crio instituições. Nunca criei, nunca criarei".
A Cabana, contudo, se sobressai mesmo com seu forte apelo emocional, que permeia a todo instante o caráter do protagonista e, através de descrições precisas e às vezes até exageradas, são transmitidas ao leitor em toda sua essência. Há sim, como já se deve imaginar que um livro assim traga, um rebuscado de frase bonitas e de efeito, mas há também muito mais além disso. Não vou, porém, recomendar diretamente o livro, contrariando o que este me pede para fazer. Prefiro apenas dizer, ignorando todo o estardalhaço que há em volta dele, que é uma boa história, que merece sim ser conhecida e apreciada. É certo que por ser uma obra de ficção, não se pode atribuir ao Deus inventado a condição de Deus verdadeiro, embora não seja bem essa a sensação que é vista no decorrer da história, na qual seus conceitos alfinetam e podem acabar perpassando os conceitos ditos sagrados. Deve ser lido e encarado, sobretudo, com a mente aberta, sem grandes expectativas, apenas se deixando levar, aproveitando o momento, a viagem que o autor propõe, reconhecendo que a trindade criada por ele funcionou muito bem em sua história, e que talvez cada um de nós possa fazer o mesmo, já que todos temos uma cabana em nossa vida, não é mesmo?
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