Frases


"O coração que se ganha é o que se dá em troca"Marcelino Freire



segunda-feira, 24 de julho de 2017

Festival Letra Viva 2017


É maravilhoso ver que Fortaleza tem vivido nos últimos meses um forte crescimento de eventos literários. Desde a recente Bienal do Livro, a Flicaixa, a inúmeros outros independentes, que reúnem as forças poéticas e narrativas da cidade, celebrando a palavra como unidade absoluta de prazer e liberdade. 
Neste cenário, soube, meio em cima da hora mas na hora certa, de um novo evento prestes a nascer, o Letra Viva - Festival da Poesia de Fortaleza. Um dos principais responsáveis, Talles Azigon, poeta incansável, que venho tendo o prazer de ver em vários destes eventos, desde que passei a frequentá-los com mais avidez. Com uma programação ampla e ao mesmo tempo compacta, o Letra Viva aconteceu nos dias 19 e 20 de julho, começando às 18h30, no centro cultural Dragão do mar, aqui em Fortaleza. 
O primeiro dia foi marcado pelo lançamento de um jornal bem peculiar, chamado "Mei-Pão". O título é uma releitura do célebre "O Pão", publicação da emblemática agremiação literária Padaria Espiritual, lá em 1892. A homenagem, além de abraçar o típico cearês (não é meio pão, é mei-pão mesmo!), concentra uma nova geração de poetas, dando vazão a essas vozes tão únicas e singulares, reunidos no impresso que de alguma maneira parece respirar os ares nobres de seu antepassado centenário. Esteticamente, o jornal também ficou muito bonito, fazendo boa referência ao estilo gráfico original. Houve ainda uma fala no auditório, onde todos receberam o "Mei Pão" como um alimento silencioso, de sabor peculiar, a ser degustado aos poucos. À frente, Talles falava da importância do evento, diante da dificuldade de se lançar livros e fazer poesia no Brasil, com custos elevados e o ainda pouco interesse por leitura.


Entre a plateia, a maioria poetas. Percebi que o evento era feito de poetas para poetas, que havia um interesse especial em cada um daqueles que ali estavam, um amor pela palavra, pela poesia. Isso ficou ainda mais evidente quando Talles pediu a cada um que se apresentasse, falasse um pouco de si. Era como uma família, todos ali, mas que ainda não se conheciam adequadamente. E vieram falas pautadas de sonhos, de vida, de ter livros publicados, de estarem ali lendo seus poemas, ou daqueles que ainda começavam a escrever. 
No segundo momento, o Letra Viva deslocou-se para a arena do Dragão do Mar, onde apresentou um sarau com todos os poetas convidados, como Francélio Figueiredo, Anna K. Lima, Jesuana Prado, entre outros. O fim da noite foi marcado por intensas declamações, chamando a atenção do público que por acaso passeava pelas imediações do centro cultural e era convidado a sentar-se no pequeno auditório improvisado ao ar livre. 





Já o segundo dia foi aberto por uma ótima palestra, intitulada "Possibilidades para a edição literária, com o Talles, representando sua editora, Substânsia e Silas Falcão, da Luazul edições. 
Uma conversa bastante franca, focada nos processos editoriais e seus desafios, da concepção à publicação de um livro. Ambos falaram de experiências próprias, enumeraram os muitos profissionais envolvidos no trabalho e sobretudo a paciência necessária para conduzir cada etapa da empreitada, ainda mais sabendo que nem sempre tudo sai como o esperado. 
Temas recorrentes dos dias de hoje, como a autopublicação (que barateia muitos custos) também foram discutidos, além da opção de zines e outros formatos de publicação. O público participou ativamente, com perguntas e comentários. Muitos ali já tinham lançado livros, ou estavam maturando melhor essa ideia. 



Alguns trechos que consegui recolher desta fala:
"Acho interessante projetar recortes do livro a ser lançado antes de ele ser comprado. Assim já criar uma atmosfera a quem ainda não conhece. Sejam bem-vindos ao livro *citou um título qualquer*. Faço muito isso na casa Juvenal Galeno, onde costumo lançar livros" – Silas

"Não lancem livros em época de propaganda eleitoral, as gráficas ficam todas voltadas aos políticos" – sugeriu a poeta Jesuana Prado.

"Estamos na era da imagem, temos de usar isso a favor do nosso trabalho" – Talles, falando da importância da capa do livro

"Não tenha prazo específico para lançar um livro. O tempo contado mata os processos, acelerar resultados nem sempre gera bons resultados" – Silas

"Pesquise e procure saber quem são as pessoas e empresas com as quais você está trabalhando na hora de pensar em publicar. E responda sempre: o que você quer com o seu livro? Aonde quer que ele chegue?" – Talles 



Para fechar o segundo e último dia de festival, todos se encontraram novamente no espaço da Arena, onde aconteceu mais uma roda de poesia, com participações de mais poetas convidados do evento, como Tetê Macambira, Alan Mendonça e outros. 
Só senti falta da feirinha poética, de livros e publicações dos poetas participantes, que constava nos dois dias de programação, e por alguma questão interna não aconteceu. Felizmente, neste último dia, o amigo e poeta Antônio Baticum, conhecido por saraus de resistência em vários bairros da cidade, levou alguns livros de doações, improvisando um espacinho bem convidativo, ao lado da vibração do sarau. Ali, ao som dos versos, entre o apanhado de livros, encontrei bons achados. 



Aproveitei ainda para enfim adquirir um livro do Talles, que fiz questão de que ele assinasse. Foi um momento bastante especial. Quando o conheci efetivamente, na Flicaixa, em maio, era ele quem comprava e buscava uma assinatura da escritora Angela Gutiérrez. Faz pouco tempo, sim, mas senti de alguma maneira um elo muito forte de energias neste ciclo.
O livrinho, "MARoriGINAL", com poemas de Talles, é de rara beleza, dotado de simplicidade acolhedora. Enxuto, preciso, direto, que de cara já vi também como provável referência para uma futura publicação minha. Daqueles livros que dá gosto de ler, sobretudo por se conhecer o autor. 



Festival Letra Viva, um grande momento, celebração da poesia, da literatura, do amor pelos livros e palavras. Fortaleza precisa de cada vez mais eventos assim, que transpirem, incendeiem, contagiem. Revi vários amigos, fiz tantos outros e mesmo os que não consegui falar, fiquei feliz de ver lá. O melhor de eventos como esse, como percebo cada vez mais, é a chance de conhecer, interagir, com pessoas que estão neste mesmo caminho, que buscam a cada dia se superar e se surpreender, encantadas com os rumos da vida – acolher, e ser acolhido.
Parabéns ao Talles Azigon e a todos os envolvidos na produção e que venha logo a segunda edição! 



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