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"O coração que se ganha é o que se dá em troca"Marcelino Freire



quinta-feira, 22 de abril de 2010

Bienal do Livro 2010: minhas impressões (III- Ziraldo)

Bem, dando continuidade à série de postagens sobre minhas impressões da recente Bienal Internacional do Livro do Ceará, falarei agora um pouco a respeito do dia da palestra de Ziraldo, que teria o seguinte tema: Ler é mais importante que estudar?

OBS.: Essa postagem é bem extensa, mas não se pode falar de Ziraldo sem falar muito!

Marcada para as 18:30, indo até as 20h, do dia 14, quarta-feira, a apresentação seria a primeira que eu esperava com grande ansiedade. Acho que já falei isso aqui, mas nunca é demais: recentemente, comecei a admirar ainda mais o trabalho de Ziraldo, que até então só conhecia de relance. Através do programa ABZ do Ziraldo, comecei a entender melhor o girar das engrenagens. Ter a oportunidade de assistir a uma palestra dele seria uma chance que tinha de ser agarrada.

Diego, meu irmão, também queria ter ido, mas estava às voltas com a produção do curta animado Maria da Glória. Assim sendo, preparei nosso exemplar de Jeremias, o bom. A ideia era tentar conseguir um autógrafo, embora soubesse que isso poderia não ser assim tão simples.
Nesse dia, cheguei ao Centro de Convenções por volta das 17:00, pois temia haver alguma fila quilométrica já formada. O auditório que receberia o grande cartunista tinha sido intitulado Memorial de Maria Moura, como parte das homenagens à Rachel de Queiroz. Era uma enorme arena contígua ao espaço dedicado ao cordel. Lá seriam realizadas boa parte das palestras desta Bienal.

A feira em geral, na altura deste dia, já estava bastante movimentada, e já era bem fácil se esbarrar nas demais pessoas para se chegar de um pavilhão a outro. Fui de imediato ao espaço marcado, sem desviar a atenção para nenhum estande, pois temia por acaso encontrar alguma oferta espetacular que me fizesse atrasar. Não tinha ideia de como andava o movimento por lá, não podia arriscar.

O espaço João Miguel, dedicado ao cordel, estava bastante tranquilo àquela hora. Atravessei as mesas onde os cordelistas expunham seus cordéis, e cheguei aos portões da arena, que para minha surpresa não abrigavam fila nenhuma. Estranhei, e fui perguntar a uma receptiva que estava por ali numa mesinha. Ela falou que às 18:00 começaria a distribuir senhas para os interessados na palestra, que deveriam já estar enfileirados. Como ainda faltava quase uma hora, decidi dar mais uma explorada na feira, julgando não ter problema sair em vez de ficar esperando. Isso, porém, me custou um lugar melhor na fila que viria a se construir minutos depois.

Rodei por alguns estandes, pesquisando alguns livros que ainda queria comprar, e voltei para o espaço do cordel, faltando uns vintes minutos para as 18h. Da entrada, o susto: uma generosa fila já havia se formado no local onde eu estivera minutos atrás. Corri para o final dela, que inconvenientemente ficava ao lado de um caixa eletrônico, me fazendo ter de recuar sempre que alguém chegava para usá-lo. Passaram-se mais uns dez ou quinze minutos, até que a tal senha enfim fosse distribuída. O movimento no local começou a crescer vertiginosamente, e a fila atrás de mim sumia na extensão de um corredor desconhecido. Curioso é que ainda havia poucas crianças no local. As fotos a seguir sintetizam um pouco do que acabei de dizer:









Com a senha 34 nas mãos, permaneci esperando mais um tempinho razoável, ora desviando para o lado para alguém operar o caixa eletrônico, ora fazendo esses registros fotográficos. O que se falava na fila era que haveria 400 lugares. E então a entrada foi liberada. Após as portas envidraçadas, vi um balcão onde estavam sendo vendidos vários livros de Ziraldo. Ao fundo, um enorme pôster seu preenchia a parede. Atravessando essa passarela, cheguei à arena propriamente dita.

Um palco de médias proporções estava no centro do espaço. Nele, uma mesa retangular com duas cadeiras esperava o início da palestra. Além do palco, tinham sido dispostos vários almofadões coloridos no chão, que foram rapidamente ocupados pelas crianças que iam entrando. Além dos almofadões, estavam dezenas de cadeiras agrupadas por boa parte da extensão disponível. Por fim, após as cadeiras, vinham duas enormes arquibancadas, uma precaução extra para conter todo o contigente de pessoas.

Havia muitos lugares para escolher, entre as cadeiras, pois os almofadões já estavam todos ocupados. Optei por um lugar um pouco atrás deles, mais ou menos no centro da arena, de onde pudesse ter uma boa visão da mesa, e também condições de registrar com fotos e vídeos. E lá se passaram mais uns vinte minutos ou talvez até meia-hora; tempo em que todos iam tomando seus lugares, que as muitas câmeras de vídeo iam sendo montadas em tripés, até que finalmente a palestra teve início.








Após uma apresentação breve da Bienal, onde se falou sobre patrocínios e afins, Raymundo Netto, que faria a mediação, foi chamado e subiu ao palco, de onde anunciou então o grande convidado do dia, Ziraldo.

É uma sensação engraçada, ver de repente, perto de você, alguém que tanto admira. Às vezes, por serem tão inacessíveis, essas pessoas parecem quase imaginárias, a habitar um mundo desconhecido. Quando temos oportunidades como essa, nos damos conta de que elas realmente existem; nos tornamos mais próximas, criamos um vínculo.

Ziraldo foi aplaudido calorosamente. Mesmo sendo um dia de semana, o público nesse momento já preenchia boa parte das arquibancadas, estando as cadeiras já totalmente ocupadas. Foram inúmeros os flashes que vi estourarem no ar quando ele subiu ao palco. A euforia, claro, também se fez presente.



Foi um dos grandes momentos da Bienal, sem dúvida. Ziraldo falou um pouco sobre o início de sua carreira, de projetos de grande sucesso, como Flicts e O Menino Maluquinho, e debateu acerca de sua já célebre frase: "Ler é mais importante que estudar!". Suas palavras, como sempre, foram bastante certeiras, mostrando o que era preciso fazer para aumentar o número de leitores no Brasil, principalmente as crianças. Falou ainda da importância do livro como instrumento de elevação moral, e comentou também sobre as histórias em quadrinhos, que também devem merecer um espaço. Um dos inconvenientes que ofuscaram um pouco o brilho da noite veio justamente agora: o microfone que ele usava. A voz às vezes estourava um pouco, e em muitos momentos me vi sem entender quase nenhuma palavra do que era dito.

Os vídeos a seguir mostram alguns trechos do que foi a palestra. Mais uma vez, a qualidade não é das melhores, mas já é um ótimo registro ;)

Ziraldo na Bienal do Livro do Ceará, trecho 1 - Abril 2010




Ziraldo na Bienal do Livro do Ceará, trecho 6 - Abril 2010




Para mais vídeos de Ziraldo, basta ir à postagem VIII- Conclusão.

Em seguida, abriu-se um espaço para perguntas. Ziraldo respondeu de maneira clara e bem-humorada à boa parte dos que levantaram as mãos. Perguntaram até se ele não pensava em fazer versões de seus personagens crescidos, a exemplo do que fez Maurício de Sousa, com a recente Turma da Mônica Jovem. Ziraldo foi simples e direto. Para ele, os personagens são eternos - não devem envelhecer - pois têm uma identidade única, que desapareceria caso fosse mudada. Citou ainda grandes personagens dos quadrinhos e do cinema que não cresceram. É certo que Maurício deve saber o que está fazendo, mas eu adorei essa resposta do Ziraldo ;)

Respondidas as perguntas, chegou a hora dos autógrafos. Uma voz anunciou que fossem formada uma fila dos interessados. Na mesma hora, quase todos os sentados se levantaram velozmente, deixando de ouvir uma parte das consideração finais que Ziraldo tinha começado a fazer, e que teve que encerrar também velozmente. Em poucos segundos foram formadas duas filas. Sim, duas. Uma para as crianças, a outra para os adultos. Ziraldo autografaria primeiro os pequenos, que já exibiam nas mãos os exemplares do Menino Maluquinho, à espera de chegar a sua vez. A outra fila, dos adultos, aumentava a cada minuto. Esperei alguns minutos para ir até ela, tempo em que fiquei fazendo mais umas fotos, pois imaginei que enquanto ainda fosse possível somar-se as pessoas, o autógrafo ainda seria garantido. Quando a fila das crianças já tinha se dissolvido e a dos adultos começava a andar, fui direto para lá, com Jeremias, o bom a tiracolo. Senti uma certa tensão e ansiedade. Dentro de poucos instantes, poderia cumprimentar Ziraldo, ter um autógrafo dele e quem sabe até conversar por alguns breves segundos. Mas todas essas ideias se perderam no momento que um dos receptivos da Bienal, estrategicamente posicionado no fim da fila, me disse que ninguém mais poderia entrar, que a fila já estava fechada.

Fiquei bastante desnorteado com essa revelação. Que absurdo! Sequer houve qualquer aviso por parte da organização a respeito disso. Por que a voz que anunciou a abertura dos autógrafos não tinha falado que haveria um limite na fila? ou uma duração mínima de tempo para as pessoas chegarem até ela? Expus essas questões ao sujeito, que ouviu de certa forma impassível. Falou ainda para que eu procurasse um dos coordenadores, que tinham camisas verdes, que talvez eles pudessem abrir essa exceção. O problema era que os tais coordenadores estavam todos bem perto da mesa onde Ziraldo autografava, em um espaço controlado pelos atentos seguranças do local, um espaço restrito. Como eu poderia me aproximar sem parecer estar querendo furar a fila ou algo parecido? Isso o receptivo não me disse, e permaneceu lá, impassível, impedindo a chegada de outras pessoas.

Inconformado, sentei por alguns instantes. Ziraldo continuava no ritmo dos autógrafos, e a fila dos adultos ia andando, mas ainda mostrava a resistência de umas 40 pessoas. Então recorri a um outro receptivo, desta vez uma moça, que passou de repente pelo meu campo de visão. Expus a questão, e ela mesma foi falar com um dos coordenadores. A resposta veio em minutos. Segundo alguém da coordenação, eu devia esperar, que após a conclusão da fila, esse mesmo alguém me levaria a uma salinha, onde Ziraldo daria o autógrafo. Isso me pareceu até bom demais na hora, e agradeci bastante! Obviamente, teria de ser reservado para não atrair mais ninguém, pois a fila já teria se extinguido. Imaginei que talvez até fosse melhor, pois poderia até mais tranquilo para conversar com ele. Animado, tirei Jeremias da sacola e comecei a ler um pouco. E sabem o que aconteceu nessa hora? A voz então anunciou que não se estava mais recebendo ninguém na fila. Então quer dizer que antes disso eu poderia ter de fato entrado nela? Nunca saberei, mas deu bastante vontade de voltar lá e dizer alguma coisa ao receptivo estraga prazeres.

Como a situação já estava aparentemente resolvida, me contive e fiquei lendo. Mas aí o tempo foi passando. Um cansaço enorme foi se abatendo sobre mim, sem falar na fome, pois não comia nada desde que saíra de casa. O que parecia ser a solução, virou outro empecilho. Já passava das 20h. Na fila, ainda umas vinte e tantas pessoas, resolutas. Ziraldo lá, autografando e ainda sendo alvo de todo tipo de lente, mesmo quando falava ao celular, que tocou entre um autógrafo e outro.

Fui ficando cada vez mais desgastado. No início, estava disposto a tentar conversar bastante com Ziraldo, mas agora já me faltava organização de ideias. Considerei ir embora, deixar aquilo para lá. Depois de já ter conseguido a exceção? mas seria mesmo? quem poderia me garantir que depois de tudo ele me daria mesmo o autógrafo? e se eu acabasse esperando até o fim à toa? Pensei nessas questões. Acho que Ziraldo acharia bacana autografar um Jeremias, o bom haja vista que lá no balcão só havia mais livros do Menino Maluquinho e outros mais recentes, mas aquela espera já estava exaustiva demais.

Olhei para o livro, em meu colo, para a fila, que agora parecia não andar, e para Ziraldo, imerso e rodeado (na parte de baixo do palco) por várias pessoas. Então me decidi. Coloquei Jeremias na sacola e saí da arena. Não fiquei triste ou chateado, só um pouco decepcionado, com a organização do evento. O autógrafo seria ótimo, é claro, mas o mais importante foi ter podido assistir pela primeira vez a uma palestra de Ziraldo. Foi um espetáculo à parte, facilmente destacado entre as programações da Bienal.

Esse acabou sendo o único dia que não comprei livro algum na feira. Fui inteiramente para a palestra. Ainda pensei algumas vezes no caminho de volta o que teria acontecido se eu tivesse ficado lá esperando. Eram realmente grandes as chances de acabar não dando certo, e mesmo que desse, não iria conseguir dizer a ele exatamente o que gostaria, dado o meu desgaste. Sendo assim, tive mais uma vez a certeza de que ler é mais importante do que estudar e voltei para casa com meu exemplar quase autografado de Jeremias, o bom.



Ainda não foi dessa vez! Mas sempre há uma próxima, enquanto houver esperança ;)


Bom, acho que já falei demais! Encerro aqui a terceira parte. A quarta postagem desta série será sobre a palestra do escritor Moacir Costa Lopes, que também tive o prazer de assistir.

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